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sábado, 17 de setembro de 2011

depoimentos e historias registradas na memoria:

"Eu acho que violência contra a mulher é o que aconteceu comigo e que acontece com outras mulheres. Se ele fosse um estranho, eu até que não estava tão revoltada, mas foi meu pai, ele não me respeitou em momento algum. Ele não me considerou como filha. Outro caso de violência é o espancamento. Além disso, eu acho que tem muito homem que tira a privacidade da mulher e pra mim isso já é uma violência. Eles fazem isso com as mulheres porque eles acham que são homens e podem tudo. Eles não vêem que se não fosse a mulher eles não estariam no mundo. Eles não olham essa parte não. Eles não, a maioria". 
(Gabriela sofreu abuso sexual, físico e psicológico por parte do pai, dos sete aos 13 anos de idade. Conseguiu sair de casa aos 14 com apoio de um serviço de saúde. (Brasil, 2000).




"Eu acho que existe violência de todo tipo. Acho que existe a discriminação muitas vezes, sabe? De você ser taxada como menos capaz. Existe aquela de casa, do marido, das mulheres que não têm um grau de instrução melhor, das mulheres que não trabalham, das mulheres que ficam em casa cuidando dos filhos. Do marido que bate, que aparece com outras na cara delas e elas não podem dizer nada porque são sustentadas por eles. E eles acham que a mulher está alí para servir de qualquer coisa, entendeu? Que eles podem falar qualquer coisa: que ela é isso, que ela é aquilo e que a mulher não pode fazer nada, entendeu? Eu acho que, por ser mulher, você ainda não pode sair sozinha. Eu estava conversando com um amigo meu, num bar, e duas mulheres estavam tomando umas cervejas, e ele disse: _olha lá: duas mulheres sozinhas numa mesa, estão esperando homem! Eu falei: qual é o problema de duas mulheres, numa sexta-feira à noite, estarem sentadas num bar? São duas amigas, tomando uma cerveja". Ele respondeu: _ que nada, quando você vê duas mulheres sozinhas, numa mesa, é porque tão esperando algum macho, alguma coisa desse tipo! Eu disse: menino! Como tu és machista, pelo amor de Deus! Quer dizer que um homem sentar numa mesa de bar sozinho é normal, mas a mulher, não? Ele respondeu: Não! (Adélia. Brasil, Ano 2000).






A HISTÓRIA DE SÔNIA
Final de ano. Sônia, 16 anos, voltava do colégio onde fez a matrícula para ingressar no segundo grau. Esperava para atravessar a rua. Um carro parou subitamente. O motorista abriu a porta e a puxou para dentro. Ameaçando-a com uma arma e dirigindo em alta velocidade, ele seguiu para uma mata afastada da cidade. Sexo oral, vaginal, uma, duas vezes. Calada, ela pensava em sua mãe e chorava. _Se você contar a alguém o que se passou, você e sua família morrem. Sônia foi para casa. Lavou-se à exaustão. Sentia-se suja. Tinha nojo de sí . Vomitou muito. Chorou em silêncio e ficou em casa vários dias. Conversou com uma amiga. Não queria incomodar sua mãe, recém-separada do marido, alcoolista, que lhe batia. A filha não queria lhe dar mais uma tristeza. Duas semanas após ela teve um pequeno sangramento e achou que era a menstruação. Quis esquecer tudo. Três meses depois, uma vizinha disse para sua mãe: _Tu não estás vendo que tua filha está grávida? A mãe foi procurá-la e perguntou: _Quem foi? Porque você me enganou? Por que você não me disse nada? Foi difícil convencer a mãe do que acontecera. Em companhia de uma prima, Sônia procurou um grupo de mulheres de sua comunidade e pediu orientação. Pouco se podia fazer, não havia serviços de atenção a vítimas de violência naquela cidade. _ Se eu tenho esse filho, lá no bairro vão dizer que eu sou uma prostituta. Se eu digo que foi estupro ninguém acredita. Nem minha mãe acreditou em mim! Sem acesso a um serviço de saúde que a atendesse dignamente, ela procurou o aborto clandestino e foi atendida num consultório sem as mínimas condições de segurança, expondo-se aos riscos da mortalidade materna porque a rede pública de saúde ainda não oferecia os serviços que poderiam garantir a Sônia o exercício de seus direitos. (Brasil, 1990)







JOSEFA E SEU COMPANHEIRO
Josefa voltava para casa com a filha adolescente, quando foi atacada por três homens. Reagiu, lutou contra e gritou: Corra minha filha! A menina conseguiu fugir. Josefa foi estuprada. Engravidou. Ao descobrir a gestação, ela conversou com o marido. Sentia muita tristeza. Raiva daqueles homens. Culpa de não ter conseguido se defender direito, de ter passado naquele lugar. Lembrava da filha e agradecia a Deus por não ter acontecido coisa pior. Ela não queria esse filho, mas não tinha coragem de abortar. Sua religião condenava o aborto. O marido lhe disse que aceitaria o filho como seu. Josefa sentiu-se apoiada, mas queria ser atendida num serviço de saúde. Mesmo com apoio do marido e tendo decidido ter o filho, a rejeição pela gravidez continuava. Ela procurava uma psicóloga que lhe ajudasse a enfrentar aquela situação. Josefa encontrou quem lhe atendesse? Não se tem a resposta. (Brasil, 1992)


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